Sim! Ninguém está acima da Constituição
*Henrique Nelson Calandra, Folha de São Paulo
Para responder de maneira clara e definitiva ao questionamento, que tem sido objeto de arroubos e frases histriônicas, é preciso deixar claro pontos cruciais.
Primeiro. O CNJ é importante peça do Judiciário e deve dispor de elementos para se desincumbir das importantes missões que lhe foram confiadas. Isso é inegável e não há ponto controverso na sociedade, menos ainda na magistratura.
Também é igualmente consensual que os que se desviam do caminho da Justiça -sejam eles médicos, políticos, advogados, engenheiros ou juízes- devem sofrer as sanções explicitadas no ordenamento jurídico, sem qualquer distinção.
Devemos, inclusive, cobrar mais dos magistrados, e é por isso que a lei contempla uma série de restrições, como vedar a prática de qualquer outra atividade remunerada, excetuando-se o magistério.
Não menos incontroverso: é preciso melhorar a distribuição da Justiça. É absolutamente vexatória a situação que é imposta às pessoas que precisam se socorrer do Judiciário para fazer valer seus direitos. Não são poucos os casos que demoram décadas até que se obtenha a palavra final da Justiça.
Igualmente sedimentado entre os que conhecem a realidade da Justiça brasileira: temos os melhores, mais honestos e mais produtivos juízes do mundo. Quem fala isso não são representantes da magistratura, e sim organismos internacionais e nacionais sérios, como o Banco Mundial e o próprio CNJ.
Fixadas essas balizas, é preciso com ponderação avaliar o real significado do CNJ e a correlata extensão de seus poderes e limites. O que a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) pleiteia em suas ações propostas perante o Supremo é saber exatamente se vivemos sob o império das leis e da Constituição ou se nos vergaremos a pressões, muitas vezes até legítimas, para a obtenção de certos resultados.
A experiência mostra que, quando se abandonam as regras estabelecidas, ainda que imbuídos de boas intenções, o resultado é catastrófico. A atividade legislativa é poder natural da representatividade dos parlamentares escolhidos pelo povo. A interpretação dessas leis é tarefa de juízes, desembargadores e ministros, que foram submetidos a processo seletivo rígido e possuem notável saber jurídico.
Desprezar esses fatos remete a um retrocesso inimaginável.
Assim, a AMB entende que o CNJ deve fiscalizar com o máximo rigor que a lei permite os membros da magistratura. A AMB entende que se deve punir exemplarmente aqueles que se desviam da missão judicante, com observância das leis e da Constituição. Em apertada síntese, o que se pergunta nas ações impetradas é quais são esses poderes e se a atuação tem se pautado nos limites das leis e da Constituição.
O Brasil dispõe de uma Corte Suprema independente, excepcionalmente bem preparada e constituída de pessoas sérias e comprometidas com os preceitos da Constituição. Assim, confiamos que a resposta a essas indagações virá de maneira serena e escorreita.
Se os ministros responderem que as ações da Corregedoria estão em conformidade com a lei e com a Constituição, aceitar-se-á a decisão.
Caso contrário, e com o pleito da AMB acolhido, empreenderemos esforços para que as corregedorias estaduais disponham de mais estrutura para perseguir aqueles que maculam a imagem do Judiciário e os retirem o mais brevemente da carreira da magistratura.
Isso porque se há alguém que não tolera injustiça e desvios de conduta, esse alguém é o magistrado brasileiro, que convive com obstáculos aparentemente intransponíveis e todos os dias se renova com a esperança de poder distribuir Justiça.
HENRIQUE NELSON CALANDRA é desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo e presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros.
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