Rastreamento na conta de juízes e servidores ocorreu a pedido do CNJ, o que causou uma crise no mundo jurídico
FELIPE SELIGMAN
RUBENS VALENTE
DE BRASÍLIA
RUBENS VALENTE
DE BRASÍLIA
Magistrados e servidores do Judiciário movimentaram, entre 2000 e 2010, R$ 856 milhões em operações financeiras consideradas "atípicas" pelo Coaf, o órgão de inteligência financeira do Ministério da Fazenda.
A informação consta de relatório encaminhado ontem ao STF (Supremo Tribunal Federal) pela corregedora do CNJ (Conselho Nacional de Justiça), Eliana Calmon.
No ano passado, Calmon entrou em choque com associações de magistrados e com setores do Judiciário ao pedir investigações sobre a vida financeira de juízes, desembargadores e demais servidores.
O trabalho da corregedoria e o poder de investigação do CNJ passaram a ser questionados até por ministros do Supremo. Calmon bateu de frente com o próprio presidente do tribunal e do CNJ, Cezar Peluso.
O trabalho de investigação do CNJ começou pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, quando passou a ser criticado por uma suposta quebra generalizada de sigilos bancário e fiscal. Três entidades ligadas a juízes entraram com uma ação no Supremo.
A investigação foi suspensa em dezembro por uma liminar do ministro Ricardo Lewandowski que, ao proferir a decisão, requisitou informações a Calmon.
O relatório do Coaf integra as explicações encaminhadas ontem, nas quais a corregedora procurou demonstrar a necessidade da continuidade da apuração sobre os depósitos bancários.
"Atipicidade" não significa crime ou irregularidade, mas sim que a operação financeira fugiu aos padrões.
Por exemplo, um depósito elevado fora do previsto leva o banco automaticamente a identificar, e a comunicar ao Coaf, uma "movimentação incompatível com a renda" do correntista. O depósito pode ter sido fruto da venda de imóvel ou herança, o que só uma investigação mais profunda esclareceria.
O documento de Calmon revela, porém, situações consideradas suspeitas pelo Coaf, como o fato de três pessoas, duas delas vinculadas ao Tribunal da Justiça Militar de São Paulo e uma ao Tribunal de Justiça da Bahia, terem movimentado R$ 116,5 milhões em um único ano, 2008.
O Tribunal da Justiça Militar de SP disse que não recebeu informações sobre o resultado da inspeção e que solicitará os dados ao CNJ. O assessor do Tribunal de Justiça da Bahia não foi localizado.
O documento, que não aponta nomes ou faz separação entre servidores e juízes, indica que, dos R$ 856 milhões em operações atípicas, R$ 274,7 milhões foram feitos em dinheiro vivo. São Paulo foi o Estado que concentrou os recursos, com R$ 53,8 milhões, seguido pelo Distrito Federal (R$ 46,7 milhões).
O ápice das movimentações atípicas ocorreu em 2002, quando "uma pessoa relacionada ao Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região", no Rio de Janeiro, movimentou R$ 282,9 milhões, segundo o relatório. A corte disse que se manifestaria apenas hoje sobre o caso.
O Coaf também apontou um salto entre 2007 e 2008, quando as comunicações do gênero passaram de R$ 30 milhões para R$ 159,6 milhões.
O levantamento começou em 2010, quando o CNJ pediu informação sobre eventuais movimentações financeiras incompatíveis do Judiciário. O órgão pesquisou os nomes de 216.805 servidores.
Desse universo, 5.160 figuraram em comunicações encaminhadas ao Coaf por setores como bancos e cartórios, num total de R$ 9,48 bilhões. O Coaf considerou que a maior parte desse valor tem explicação plausível.
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