segunda-feira, 12 de novembro de 2012

Senador João Capiberibe joga pesado contra gastos astronômicos da Assembleia Legislativa e TCE-AP

Discurso da tribuna do Senado Federal em 01.11.2012

O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco/PSB – AP. Pronuncia o seguinte discurso. Com revisão do orador.)

Sr. Presidente, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, ouvintes da Rádio Senado, telespectadores da TV Senado:

Trago aqui a esta tribuna um tema muito importante para a sociedade brasileira no geral e, em particular, para o povo do Amapá. Ontem, o Tribunal de Justiça do Amapá, pela primeira vez na história, recebeu denúncia do Ministério Público contra deputados estaduais.

Por unanimidade, os desembargadores do Tribunal de Justiça do Amapá receberam denúncia formulada pelo Ministério Público do Estado contra os Deputados Estaduais Moisés Souza e Edinho Duarte, além dos demais envolvidos em fraude entre a Assembleia Legislativa e a Cooperativa de Transporte de Veículos Leves e Pesados do Estado do Amapá (Cootram).

Para o Ministério Público do Amapá, os Deputados Moisés Souza e Edinho Duarte comandaram um esquema criminoso que resultou no desvio de mais de R$5 milhões dos cofres públicos da Assembleia Legislativa, em contratos fraudulentos com a Cootram para locação de veículos leves e pesados.

Na denúncia, a Procuradora-Geral do Ministério Público Ivana Cei afirma que os parlamentares ordenavam e assinavam os cheques indevidamente pagos. Nesse mesmo período, os deputados gastaram mais de R$5 milhões com aluguel de veículos, pagos com verba indenizatória.
 
Embora a defesa dos acusados tenha alegado que o Ministério Público não poderia conduzir o procedimento investigatório contra parlamentares, a Relatora, Desembargadora Sueli Pini – aqui, eu destaco que é a primeira mulher a chegar ao desembargo no Amapá –, com base em entendimento majoritário do Supremo Tribunal Federal, manifestou que a Polícia Judiciária não tem o monopólio da ação penal, sendo, portanto, perfeitamente possível que a investigação seja conduzida por promotores.

Sobre o afastamento dos réus de suas funções, a Relatora esclareceu em seu voto o seguinte:

(...) os denunciados teriam formado um poderoso grupo organizado com o escopo de apoderar-se de recursos dos cofres públicos através de pseudo contratos celebrados com a Assembleia Legislativa do Amapá, motivo pelo qual mantê-los afastados de quaisquer funções que poderiam, em tese, facilitar-lhes a reiteração das condutas delituosas ou mesmo a ocultação de provas ou a intimidação de testemunhas é medida que se impõe como garantia da própria atuação judicial (...).
Por maioria, os desembargadores decidiram manter o afastamento dos réus. Eles responderão pelos crimes de lavagem de dinheiro, formação de quadrilha, peculato, falsidade ideológica, fraude em licitações, corrupção passiva e falsidade documental.
 
Os acusados são: Moisés Reategui de Souza, ex-Presidente da Assembleia Legislativa; Jorge Evaldo Edinho Duarte, Secretário-Geral da Mesa; Lindeberg Abel do Nascimento, ex-comandante da Polícia Militar, que servia como assessor da Assembleia Legislativa; Edmundo Ribeiro Tork, Janiery Torres; José Maria Miranda Cantuária; Rogério Cavalcante; Ednardo Tavares de Souza, filho do ex-desembargador que se aposentou no começo deste ano; Gleidson Luiz Amanajás Silva; Vitório Miranda; Fúlvio Sussuarana; Fran Soares Júnior, ex-Presidente da Assembleia Legislativa; Elton Silva Garcia; Danilo Góes de Oliveira; José d a Costa Góes Junior; Sinésio Leal da Silva e Antônio Basilízio Lima da Mata Cunha. São essas as pessoas que respondem a processo criminal perante o Tribunal de Justiça do Amapá.

E, na esteira dessa decisão, eu gostaria de tecer alguns comentários sobre a execução orçamentária e financeira do Amapá dos últimos 17 anos.

Eu fiz um levantamento dos gastos da Assembleia Legislativa do Amapá, de 1994 a 2012, ou melhor, a 2011, e também do Tribunal de Contas do Estado.
COMPARATIVO DOS GASTOS X GASTOS CORRIGIDOS(INFLAÇÃO)
ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA
Ano
Gasto anual AL
Gasto anual AL corrigido
 Inflação
1994
13.392.694,71
44.854.582,36
 
1995
26.515.907,64
72.554.428,90
22,4
1996
30.113.688,20
75.181.472,17
9,6
1997
28.292.136,95
67.142.404,18
5,2
1998
24.562.751,76
57.317.495,11
1,7
1999
24.321.661,08
52.116.535,29
8,9
2000
24.205.929,00
48.932.588,88
6
2001
26.016.883,85
48.833.293,23
7,7
2002
32.715.621,09
54.583.751,65
12,5
2003
45.170.537,94
68.951.435,70
9,3
2004
45.117.747,62
64.006.368,87
7,6
2005
72.976.438,17
97.945.267,05
5,7
2006
88.253.197,63
114.887.446,47
3,1
2007
91.197.700,18
113.608.211,48
4,5
2008
99.567.675,52
117.124.633,42
5,9
2009
90.687.352,73
96.582.030,66
4,3
2010
125.553.599,72
133.714.583,70
5,9
2011
101.896.192,14
101.896.192,14
6,5

Fui eleito governador em 1994, entre 15 de novembro, dia da eleição e 1º de janeiro quando assumi o governo, a Assembleia Legislativa e o governador que estava saindo, remanejaram os recursos que estavam destinados para investimento no de 1995, transferindo-os para a Assembleia Legislativa e o Tribunal de Contas do Estado, fazendo com que, em valores nominais, os gastos da Assembleia Legislativa, que foram que R$13.392.694,71, em 1994, saltassem para R$26.515.907,64, no ano seguinte, com a inflação já sob controle.

Os gastos do Tribunal de Contas foram mais longe ainda, saltaram de R$ 4.275.514,76 para R$13.729.082,18. Em função desse golpe orçamentário o Estado foi condenado a ficar sem investimento durante muitos anos.

COMPARATIVO DOS GASTOS X GASTOS CORRIGIDOS(INFLAÇÃO) DO TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO

Ano
Gasto anual TCE
Gasto anual TCE corrigido
 Inflação
1994
4.275.514,76
14.319.480,36
 
1995
13.729.082,18
37.566.344,34
22,4
1996
14.790.315,70
36.925.324,48
9,6
1997
14.479.843,43
34.363.310,97
5,2
1998
16.239.672,00
37.895.482,13
1,7
1999
16.457.166,10
35.264.469,60
8,9
2000
15.415.576,00
31.162.780,11
6
2001
20.558.857,00
38.588.660,27
7,7
2002
19.305.858,00
32.210.489,16
12,5
2003
26.611.708,88
40.621.954,43
9,3
2004
20.113.853,03
28.534.551,57
7,6
2005
30.822.248,09
41.368.055,17
5,7
2006
40.631.656,33
52.894.029,53
3,1
2007
41.405.114,92
51.579.821,02
4,5
2008
53.432.335,04
62.854.160,47
5,9
2009
45.605.059,70
48.569.388,58
4,3
2010
60.670.008,00
64.613.558,52
5,9
2011
36.467.828,00
36.467.828,00
6,5

Lembro que, em 1995, todas as obras do Estado pararam. Se compararmos os gastos da Secretaria de Infraestrutura, encarregada dos investimentos em obras de saúde, educação, segurança e administração, construindo hospitais, centros de saúde, escolas, prédios para a Administração, delegacias, penitenciárias etc, essa Secretaria que em 1994 investiu R$ 40 milhões, caoiu para 3,5 milhões em 1995, meu primeiro ano de governo.

A mesma coisa aconteceu no setor de transporte. A Secretaria de Transporte que investiu R$ 21 milhões em 1994, no ano seguinte não chegou a R$ 4 milhões. O Estado parou nas minhas mãos por causa dessa manobra.

Essa manobra – pasmem, Srs. Senadores, Srªs Senadoras e os que estão me ouvindo –, que me parece uma prática corrente em nosso País, fez com que, de 1994 até 2012, a Assembleia Legislativa e o Tribunal de Contas tenham gasto, além da necessidade da sua manutenção, algo em torno de R$100 milhões por ano. Neste ano, a Assembleia Legislativa e o Tribunal de Contas devem atingir gastos da ordem de R$200 milhões, quando, na verdade, com R$100 milhões teriam um desempenho impecável, tanto um como outro. São 17 anos com um desvio sistemático de algo em torno de R$100 milhões por ano, que perfazem R$1,7 bilhão.

O Governo do Amapá junto com o Governo Federal estão construindo 5 mil habitações; e habitações de boa qualidade. O conjunto dessa obra, dotada de toda infraestrutura – escolas, segurança, saúde – chega em torno de R$300 milhões. Esse R$1,7 bilhão teria resolvido, nesses17 anos, o problema gravíssimo de habitação que  enfrentamos hoje, com milhares de famílias morando em áreas alagadas. Com essa fortuna daria para construir, no mínimo, 20 mil habitações; e mais, sobraria para dotar todas as cidades do Estado de água e esgoto.

Então, o desvio dessa fortuna, condenou o povo do Amapá a ficar sem água tratada, durante esses anos todos, e também sem habitação e esgotamento sanitário.

Todo mundo sabe que no dia 10 de setembro de 2010, uma operação da Polícia Federal no Amapá levou para a prisão as principais lideranças daquele momento: o ex-Governador Waldez Góes; a primeira-dama Marília Góes, o Governador em exercício Pedro Paulo; o Presidente do Tribunal de Contas Júlio Miranda. E este ano, a Justiça voltou a agir afastando cinco conselheiros do Tribunal de Contas; e agora o Tribunal de Justiça confirmou em definitivo o afastamento do Presidente da Assembleia deputado Moises Sousa e o Secretário-Geral da Mesa deputado Edinho Duarte, ambos afastados por decisão monocrática da desembargadora Sueli Pini desde o mês de maio, se não me engano.

Tive o cuidado de levantar e analisar a contabilidade do Tribunal de Contas do Estado dos últimos 3 anos. Em 2010, ano da operação Mãos Limpas, o TCE, com apenas um prédio de quatro andares pra manter, gastou R$ 64.613.558,52, um ano depois, no exercício de 2011, esses gastos despencaram para R$ 36.467.828,00.

Como se explica, de um ano para o outro, essa queda tão drástica nas despesas do TCE? É simples, em 2010, a operação da Polícia Federal, além de prender o Presidente, fez busca e apreensão na sede do TCE, dando um basta no desvio dos recursos. Em 2011, a nova direção do Tribunal passou a ter um cuidado maior na aplicação dos recursos e os gastos de um ano para o outro diminuíram em R$ 28.145.730,50. Esse dinheiro passou a engordar os saldos financeiros do Tribunal no exercício de 2012, e por não haver previsão orçamentária teria que ser devolvido, o que não aconteceu até o presente. Soube ultimamente que uma parte desse dinheiro foi usado para recolher o imposto de renda dos servidores, retido ao longo de muitos anos, e não entregue ao fisco.
 
Hoje, a situação da Assembleia Legislativa é semelhante a do Tribunal de Contas. Depois da ação enérgica do Ministério Público Estadual, dificultando, sobremaneira, o desvio do dinheiro, tem-se notícia de que Assembleia Legislativa do Estado do Amapá, esse ano, acumulou um volumoso saldo financeiro sem ter em que gastar. Que absurdo! A comunidade ser penalizada exatamente por aqueles que escolheu para representá-la, pior, em cumplicidade com a instituição, no caso o TCE, que deveria zelar pela correta aplicação dos seus recursos, afinal essa é a função dos Tribunais de Contas, instituídos em nosso País para cuidarem da res publica e não para se locupletarem com os recursos do contribuinte.
Essa é uma questão que ainda vai ter novos desdobramentos, porque a sociedade do Amapá, o povo do Amapá só agora está tendo conhecimento desses fatos.
 
Como é possível, um desvio anual de recurso da ordem de R$100 milhões? A Assembleia Legislativa do Amapá, com 24 parlamentares, não poderia ter um custo acima de R$ 3 milhões por mês. A Câmara de Vereadores do Município de Macapá, que tem 17 vereadores, consome R$14 milhões por ano; enquanto isso, a ALAP gasta R$13 milhões por mês. Basta essa comparação para chegarmos à conclusão de que povo do Amapá, ao longo de sua história, ao longo dos últimos 17 anos, foi duramente penalizado pelo comportamento das suas lideranças.

Finalmente reconheço a ação determinante do Ministério Público Estadual e a sábia decisão do Tribunal de Justiça do Amapá. Essa decisão, repito, é histórica, e fundamental para a sociedade que precisa ver a justiça triunfar, e mais ainda para nós políticos, porque, uma das estratégias do político corrupto é promover a confusão e a desconfiança afirmando que somos todos iguais nos empurrando pra vala comum para que não haja esperança. A impunidade é a principal aliada do político corrupto. Subi a esta tribuna para destacar o feito do Ministério Público do Estado, que apresentou a denúncia, e do Tribunal de Justiça, que acatou essa denúncia.

Somente com um Judiciário operante, ágil, eficaz, que julgue com rapidez e que não tolere a impunidade, nós podemos separar o político correto, o político decente, do político desonesto e que causa danos irreparáveis à sociedade.

Era isso, Sr. Presidente.

Muitíssimo obrigado.

Obrigado, Srs. Senadores.

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