Samir Oliveira
A política de alianças do PSOL nas eleições municipais de outubro deste ano tende a se flexibilizar. Tradicionalmente ligados ao PSTU e PCB em disputas eleitorais, os socialistas acenam com a possibilidade de se coligarem com outras siglas em algumas cidades nas eleições municipais deste ano.
O caso mais emblemático é o de Macapá, capital do Amapá. Lá, o vereador Clécio Luís (PSOL) está conversando com todas as forças políticas – inclusive com o PSDB – e já articula uma aliança com o PPS e o PCdoB, dois partidos aos quais o PSOL faz oposição no Congresso Nacional.
No Rio de Janeiro, o deputado estadual Marcelo Freixo (PSOL) desponta como uma candidatura forte. O parlamentar ganhou notoriedade nacional por sua atuação contra as milícias, tanto é que sua reeleição contou com 177 mil votos, aumento expressivo diante dos 13.547 votos que o levaram pela primeira vez à Assembleia Legislativa.
Para tentar chegar a um segundo turno na disputa contra o atual prefeito Eduardo Paes (PMDB), Freixo busca aliados para além do PSTU e do PCB. O socialista mira na popularidade do deputado federal Fernando Gabeira (PV), que fez 846,4 mil votos na cidade do Rio de Janeiro em 2010, quando concorreu ao governo do estado aliado ao DEM e ao PSDB.
As movimentações políticas contam com o aval da direção nacional do partido, que chancelou, no congresso nacional realizado em dezembro do ano passado, a flexibilização das alianças. A resolução votada pelos delegados do PSOL estipula que “o diretório nacional avaliará caso a caso as alianças que avançarem para além do acúmulo da Frente de Esquerda (PSTU e PCB), cabendo somente a essa instância a decisão final sobre a possível concretização de ampliações”.
A diretriz também estabelece como prioritárias as disputas em Macapá, Belém e Rio de Janeiro. “Serão prioritárias para o PSOL as disputas pelas capitais do Pará, Amapá e Rio de Janeiro, em função do acúmulo partidário e das grandes potencialidades de vitórias político-eleitorais existentes nessas cidades”, orienta a resolução.
Procurado pela reportagem do Sul21, o presidente nacional do PSOL, deputado federal Ivan Valente, não quis se manifestar sobre as negociações em curso em Macapá. A assessoria do parlamentar alegou que cabe às instâncias locais do partido decidirem e que, havendo contestações, a direção nacional irá se posicionar.
“O PSOL nasceu discutindo um arco maior de alianças”, entende senador
O senador Randolfe Rodrigues (PSOL-AP), principal articulador da campanha municipal em Macapá, entende que o PSOL precisa se deslocar dos tradicionais aliados e procurar outras forças políticas para disputar as eleições. Ele explica que o partido “já nasceu discutindo um arco maior de alianças”, além das parcerias com PSTU e PCB, e lembra que em 2006 havia a possibilidade de uma coligação com o PDT para a corrida pela Presidência da República.
Randolfe, um ex-petista que chegou ao Senado em coligação com o PTB, considera que o partido não pode ficar preso a alianças somente com PSTU e PCB. “Me filiei ao PSOL porque acredito que o partido precisa levar em consideração o acúmulo à luta institucional. O PSTU acha que a luta institucional não vale a pena e que as eleições não têm finalidade. Nós achamos que as eleições são importantes para melhorar a vida das pessoas”, defende o senador.
O parlamentar não enxerga contradições numa possível aliança com o PPS – partido que atua alinhado ao PSDB e ao DEM no Congresso Nacional. “Eu não excluiria em hipótese alguma uma aliança com um partido que tem como referência nacional uma figura que é um ícone da luta democrática brasileira”, elogia o senador, em referência ao deputado federal Roberto Freire (PPS-SP).
Randolfe desmente os rumores de que o PSOL em Macapá também desejaria se coligar com o PSDB, conforme circulou na imprensa local após uma reunião do vereador Clécio Luís, pré-candidato pelo PSOL, com o deputado estadual tucano Michel JK. “Dialogamos com todos, mas não há possibilidade alguma de aliança envolvendo o PSDB”, esclarece.
A executiva do PSOL no Amapá chegou a divulgar uma nota para explicar as conversas. “Coligação com o PSDB não está contemplada, porém o diálogo com todas as expressões da política é democrático e faz parte da conduta civilizada”, diz o texto.
O senador Randolfe Rodrigues avalia que é possível manter a coerência programática do PSOL numa aliança com o PPS e o PCdoB. “Não cederemos nenhum milímetro nas nossas convicções”, alertou, resumindo a estratégia eleitoral numa frase: “Flexibilidade na tática, firmeza no princípio”. O parlamentar garante que um governo do PSOL em Macapá seria pautado por um “programa de transformações e com radical participação do povo nas decisões políticas”.
A reportagem entrou em contado com a assessoria do vereador Clécio Luís, mas não obteve retorno até o fechamento.
“Vejo com muita preocupação os movimentos políticos do Randolfe”, critica Luciana Genro
Liderança do PSOL gaúcho, a ex-deputada federal Luciana Genro não vê com bons olhos a flexibilização das alianças defendida por outros setores do partido. Ela critica a postura do senador Randolfe Rodrigues (PSOL-AP) e acredita que uma distensão sem critérios pode prejudicar a sigla nacionalmente.
“As alianças que o Randolfe defende são bastante complicadas. Vejo com muita preocupação os movimentos políticos dele. Ele tem nos causado bastante polêmica. Se aliou ao PTB e com figuras que não têm nada a ver com a esquerda para se eleger”, dispara Luciana.
A ex-deputada alerta que a flexibilização da política de alianças do PSOL pode prejudicar o partido em nível nacional. “Não é uma questão apenas local, a política de alianças de um partido tem reflexo nacional. Quando se abre uma exceção a um partido que não faz parte do nosso perfil, é preciso que ela seja muito bem fundamentada”, explica.
Luciana cita como exemplo de uma exceção bem fundamentada a coligação que fez com o PV para disputar a prefeitura de Porto Alegre em 2008. “Foi uma aliança debatida e fundamentada pelo perfil que o PV tinha aqui, pela proposta que conseguimos construir conjuntamente”, compara.
PSTU diz que PSOL se transforma mais rapidamente do que o PT
O afrouxamento que o PSOL vem sinalizando em sua política de alianças já provoca duras críticas por parte de seus tradicionais aliados de esquerda, como o PSTU, partido que apoiou Heloísa Helena (ex-PSOL-AL) na disputa pela Presidência da República em 2006.
O afastamento entre PSTU e PSOL não chega a ser uma novidade. Já nas eleições de 2008 em Porto Alegre, não foi possível uma aliança entre os dois porque o PSTU não concordou com o fato de a então candidata Luciana Genro ter aceitado receber R$ 100 mil da Gerdau.
A notícia de que o PSOL estaria se coligando com o PPS em Macapá este ano despertou reações no PSTU. Vários artigos no site do partido analisam a conduta do antigo aliado e apontam que o PSOL estaria “se transformando mais rapidamente que o PT”.
O ex-candidato à vice-prefeito de Fortaleza pelo PSTU, Lucas Scaldaferri, acredita que a militância do PSOL pode contornar a situação. “Para a militância socialista do PSOL, o futuro do partido está em jogo. Para aqueles que oscilam entre o socialismo revolucionário e o reformismo ‘socialista’ a hora do acerto de contas está chegando”, alerta, num artigo publicado no site do PSTU. Ele acredita que a “traição” da direção do PSOL “pode cair como um balde de água gelada sobre a consciência dessa nova geração de ativismo”.
A ex-deputada federal Luciana Genro garante que não está preocupada com as críticas do antigo aliado. “Isso não me preocupa. Embora tenhamos identidade ideológica com o PSTU, é um partido muito difícil de fazer política, possui dogmas dos quais não abre mão”, observa.
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