MAURO ZANATTA , ENVIADO ESPECIAL , OIAPOQUE,
AMAPÁ - O Estado de S.Paulo
No extremo Norte do Brasil, jaz uma reluzente, colossal e ainda inútil obra
do governo federal. A ponte binacional sobre o Rio Oiapoque, na fronteira do
Amapá com a Guiana Francesa, está pronta para integrar os dois lados desde junho
de 2011. Mas até agora, 30 meses depois da entrega, ninguém pode cruzar
oficialmente os 380 metros das suas arcadas estaiadas.
Emblemática da lentidão da burocracia para concluir obras públicas no País, a
"obra de arte especial", como é chamada no jargão da engenharia, foi construída
em dois anos ao custo de R$ 71 milhões - a conta foi rachada com a França,
metrópole do território ultramarino.
Até aqui, a ponte rodeada de floresta equatorial funciona mais como um muro a
impedir a circulação de mercadorias e pessoas, obrigadas a usar voadeiras e
catraias (pequenos barcos locais) para cruzar a fronteira até Saint George de
L'Oyapock, na outra borda do manso Rio Oiapoque.
Isso porque a construção da aduana brasileira só começou há quatro meses. E
está longe da conclusão, prevista para novembro de 2014. O projeto deve consumir
R$ 13,7 milhões dos cofres públicos, mas o governo do Amapá gastará outros R$ 6
milhões na ligação de dois quilômetros entre a ponte e a BR-156.
A demora amazônica da obra liquidou a possibilidade de uma inauguração
oficial pelos presidentes Dilma Rousseff e François Hollande em dezembro - o
francês deve estar em Brasília no dia 12. Há dez dias, na capital Macapá, o
senador José Sarney (PMDB-AP) anunciou um encontro presidencial na fronteira. O
gesto, visto como ato de campanha eleitoral, irritou o governador Camilo
Capiberibe (PSB) e deixou o Itamaraty em "saia-justa" com os franceses.
Na dúvida, e pressionado a garantir eventual presença ilustre, o governo
federal está erguendo um "puxadinho" emergencial de R$ 850 mil para ser usado
como aduana provisória até terminar a obra definitiva.
Sob o sol impiedoso da linha do Equador, estão sendo montados módulos
pré-fabricados de madeira e alumínio, sob tendas de lona branca em forma de
pirâmide. São estruturas semelhantes a stands de feiras agropecuárias, levadas
de caminhão por 5 mil km e 12 dias entre Joinville (SC) e Oiapoque - incluindo a
balsa sobre o Rio Amazonas. Até agora, dez viagens. Mesmo com o "puxadinho"
pronto, a fronteira permanecerá fechada até a assinatura de acordos bilaterais
sobre exigências legais essenciais. O Itamaraty admite que a ponte não será
aberta sem a assinatura desses acordos.
A comunidade local reage. "Aqui, é tudo 'encantado', tudo é muito lento.
Quando demora pouco, leve seis meses. Faltam técnicos para projetos. Essa BR tem
mais de 30 anos e não está pronta", diz o prefeito de Oiapoque, Miguel do Posto
(PSB). O superintendente do Sebrae, João Carlos Alvarenga, resume: "Essa ponte
virou um muro. Terminar a obra é só um primeiro passo". Importador de pneus, o
empresário Raimundo Batista diz que "pior é que nada nem é mais prometido".
No lado guianense, a aduana está pronta. As guaritas de alvenaria são
vigiadas por um efetivo da polícia francesa de fronteira. Na quinta-feira, o
Estado presenciou alguns operários construindo um belvedere de frente para o rio
e retocando o paisagismo na cabeceira da ponte.
O Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) explica o
atraso pela dificuldade de selecionar empreiteiras para realizar as obras, cuja
licitação foi ignorada em duas tentativas.
Fornecedora da Infraero, a catarinense Paleta, que terminava obra em Teresina
(PI), só aceitou após carta-convite do diretor-geral do Dnit, general Jorge
Fraxe. "Expedi convites a uma dezena de empresas. Só a Paleta respondeu", disse
ao Estado, na quinta, durante visita a Oiapoque com o secretário estadual de
Transportes, Bruno Mineiro.
A origem do atraso, avalia, está na separação das obras da ponte e da aduana.
A greve de 74 dias no Dnit a partir de junho deste ano, a complexa logística
para operar no local e o implacável regime de chuvas da região, afirma,
complicaram os planos.
"Vamos terminar a aduana provisória agora, no início de dezembro, e entregar
a obra definitiva em maio, bem antes do prazo." Fraxe diz já ter enviado
computadores e material de escritório para a aduana. "Minha parte eu estou
fazendo."
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