Cristian Klein no Valor
O Estado tem apenas 420.799 eleitores, ou 0,31% do total do país. É o segundo menor. Só perde para Roraima. Mas se transformou no lugar onde o número de escândalos de corrupção é inversamente proporcional ao tamanho de seu eleitorado. O Amapá dará posse no sábado a um novo governador que encontrará a administração pública combalida por dívidas e uma estrutura podre, revelada pelas investigações que levaram à prisão quase duas dezenas de altas autoridades de todos os poderes - Executivo, Legislativo e Judiciário.
Foi nesse clima de crise institucional que Camilo Capiberibe (PSB) venceu a mais imprevisível das corridas a governador. E tornou-se o mais improvável dos eleitos, depois de sair de um distante quarto lugar, com 10% das preferências, e alcançar uma vitória surpreendente, que lhe dará muito trabalho.
Para fazer um bom serviço, Camilo Capiberibe - de 38 anos, o mais novo entre os governadores eleitos - terá de operar com destreza em duas frentes: a política - devido à frágil maioria parlamentar - e a administrativa, já que o Estado está afundado em dívidas, estimadas em R$ 1,3 bilhão. Na primeira frente, Camilo espera contar com adesões tais como as que lhe caíram no colo depois de avançar ao segundo turno pela diferença de 1.633 votos (0,49%) para o terceiro colocado, Jorge Amanajás (PSDB). No primeiro turno, tinha coligação só com o PT. No segundo, recebeu apoio de oito partidos e de uma banda do PMN, que estava com seu adversário, Lucas Barreto (PTB), mas rachou.
Com a vitória, por apenas 7,54%, o vento a favor continuou. Sua coligação elegeu apenas dois deputados estaduais, ambos do PSB, do total de 24 parlamentares da Assembleia. Mas Capiberibe procurou e foi procurado por deputados que estiveram com seus oponentes. Sua esperança é a de formar uma maioria de até 16 parlamentares.
Onze deles, ou seja, quase a metade, foi eleita por partidos que apoiaram o governador Pedro Paulo (PDT), que ficou preso por nove dias, em meio à campanha, após a operação Mãos Limpas, da Polícia Federal, que prendeu mais 17 autoridades. Camilo não se diz constrangido com as adesões.
"Não dá para não ter apoio, porque senão restringe. Aí sobra pouca gente. Mas isso não significa que estejam envolvidos (com o esquema de corrupção). Não vou empurrar para a oposição", afirma.
Capiberibe argumenta que houve uma renovação alta na Assembleia, de 50%, e que a chegada de novatos aliada à presença de uma parte de deputados não diretamente envolvida com os escândalos facilitariam a formação de uma base de "fichas limpas". O governador considera natural a intensa negociação por cargos, mas afirma que a direção do governo será clara. Ressalta que até o PDT, na oposição, poderá apoiar o governo, em votações pontuais, pois "não é momento de jogar contra".
O próximo mandatário do Amapá refere-se ao enorme desafio de sanear as contas do Estado, sua segunda frente de batalha, a administrativa. Hoje, o governo é composto por mais de 70 órgãos, de autarquias à defensoria. São 40 secretarias, sendo seis denominadas secretarias especiais de desenvolvimento setorial, as quais as demais se reportam. "É quase uma duplicata. Vamos enxugar, acabar com essas secretarias", diz.
Em meio à transição, o governador eleito esperava ter acesso aos estimados 6 mil contratos administrativos em vigor. São servidores em caráter temporário - fora dos quadros dos concursados e dos nomeados em cargos em comissão. "Desses 6 mil, 2 mil são cabos eleitorais".
Da dívida de cerca de R 1,3 bilhão, segundo seus cálculos, Capiberibe afirma que R$ 500 milhões são das companhias estaduais de água, esgoto e energia, outros R$ 500 milhões são débitos com fornecedores e empreiteiras, R$ 55 milhões referem-se a créditos consignados que não foram repassados e R$ 400 milhões dizem respeito a um rombo no regime de previdência dos funcionários do Estado, a Amprev.
"O governo nos passou um valor de R$ 200 milhões, mas sabemos que está subestimado, é pelo menos o dobro. Desde julho de 2009, recolhe-se a parte do servidor, mas não se repassa a parte patronal", diz Camilo Capiberibe.
O novo governador é filho do casal João (ex-governador e ex-senador) e Janete Capiberibe (deputada federal), que foram eleitos em outubro - ele para o Senado, e ela para a Câmara. Mas o TSE os enquadrou na Lei da Ficha Limpa. O caso segue para o STF. O casal é acusado de compra de votos em 2002, mas há indícios de que testemunhas foram compradas por adversários políticos.
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