quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

As confissões de um oligarca - Por João Silva

Logo, logo, correndo tudo bem, José Sarney entra na segunda metade do mandato de oito anos conferido pelo povo do Amapá em 2006, o que, repito, correndo tudo bem, completará substancial reforço [24 anos!] acrescido a uma carreira política que poderia ter acabado quando deixou a Presidência da República em l989, melancolicamente.

Desconte-se das duas décadas tudo que o peemedebista percorreu antes de ascender ao ponto mais alto de sua trajetória política, a Presidência da República, aonde chegou antes de migrar para este recanto de luz em busca de um trampolim para voltar ao Senado sem correr o risco de uma disputa com seus adversários do Maranhão.

Tanto tempo (ufa!) sugere prestação de contas, sugere uma olhada no retrovisor para saber o que nos aconteceu nestes vinte anos de relação sem calor humano com essa figura capaz de influenciar um dos presidentes mais populares da história do Brasil, Luis Inácio da Silva, seu amigo e protetor.

Claro que ninguém esqueceu que foi Lula, sim, que tirou Sarney ofegante das águas turvas de uma crise sem precedentes que atingiu o Senado em 2008, lhe estendendo a mão no momento mais difícil de sua vida pública, quando sua cassação parecia inevitável.

E só ele mesmo, Lula, poderia fazê-lo, e olha que teve que contar com o recuo da oposição que afinal acabou pagando caro por isso, já que o povo, percebendo a manobra, negou-se a reconduzir ao Senado alguns dos seus representantes mais ilustres, como Arthur Virgílio (PSDB/AM), Tasso Geiressate (PSDB/CE), e Mão Santa (PSC/PI), gente que queria passar o Senado a limpo.

Mas cuidemos de nós porque o Amapá vive os últimos dias de um governo crivado por escândalos e operações da PF. Dia desses encontrei o senador eleito Randolfe Rodrigues, do PSOL; foi uma conversa muito gentil, como não poderia deixar ser. Depois de parabenizá-lo pela votação, ele me disse que havia visitado José Sarney em Brasília, a quem sugerira uma atuação mais incisiva a favor do Estado do Amapá, uma meia cobrança, digamos.

Novamente, agora diante de jovem senador da república, Sarney respondeu a cobrança, ou meia cobrança, rezando ladainha que todos conhecem, segunda a qual não ajudou o Estado porque os governadores não o ajudaram a nos ajudar – desde Barcellos à Waldez Goés, incluindo também os mandatos curtos de Dalva Figueiredo (PT) e do Pedro Paulo Dias (PP), que se encerra dia 1º de janeiro de 2011.

É isso mesmo que você leu! O Sarney tirou a carapuça da cabeça dele e botou na cabeça de todos os ex-governadores do Estado, e não só na de João Capiberibe, acusando-os de rejeitarem sua contribuição, de negligenciarem os interesses do povo, considerando que tal desencontro redundou em perda de tempo, em atraso, em obras de infra-estrutura que não foram concluídas nos últimos 20 anos, como a BR-156, o Aeroporto Internacional de Macapá e outras que poderiam ter melhorado a situação sócio-econômica do Estado e a qualidade de vida do povo amapaense.

Impressiona, aliás, a insistente frieza de José Sarney quando se trata de reagir a quem lhe cobra a força prometida aos amapaenses frustrados diante dos resultados que não foi capaz de produzir ao longo de duas décadas de sucessivos mandatos e cargos que ocupou no parlamento graças à generosidade do eleitorado do Amapá.

Claro que muita gente deve estar arrependida de ter votado em Sarney todo esse tempo! Como engolir essa coisa vinda de alguém com o cacife de presidente do Congresso Nacional, de que não fizera o que deveria ter feito por que os governadores não foram sensíveis ao que poderia nos oferecer além da ninharia que trouxe para o Amapá nestes últimos vinte anos.

Octogenário, doente, Sarney sofre o desgaste do intenso envolvimento nas disputas por cargos e poder aqui, em Brasília e no Maranhão; vai precisar ser estimulado agora que o consenso geral, inclusive da imprensa que ele criou, é de que o peemedebista tem um mandato pelo Amapá, e vai ter que tufar a veia do pescoço para ajudar a tirar o Estado do buraco a que foi levado por seus aliados nos últimos anos – boa parte composta de políticos e empresários que deveriam ter ido para a Papuda e não foram.

Sem pedir reserva senador eleito ainda me disse que Sarney se queixara amargamente daqueles que o procuram em Brasília para pedir favores pessoais, e não benefícios para o Estado e a população; alguns, imagino, para implorar proteção diante da Justiça e da lei, outros tantos para requerer miudezas a quem podia tirar do governo de Lula [e pode tirar do governo da Dilma também], recursos para investir no turismo, em meio-ambiente, em casas populares, hospitais, estrada de ferro, aeroportos, rodovias, hidrelétricas e banda larga.

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