Negros têm 2,6 vezes mais chances de morrer do que brancos no Brasil (Imagem: Pragmatismo Político) |
Dados comprovam que morrem mais negros do que brancos no Brasil. Segundo o Índice de Vulnerabilidade Juvenil à Violência e Desigualdade,
os jovens negros têm 2,6 mais chances de morrer do que os brancos. Os
dados da pesquisa foram atualizados em 2014 para incluir a desigualdade
racial, e o resultado foi que o risco de os adolescentes e jovens de 12 a
29 anos sofrerem violência aumenta quando esse fator é levado em conta.
A média se refere a 2012, último ano em que há dados consolidados, e
mostra pequeno aumento em relação há cinco anos. Em 2007, o risco
nacional era 2,3.
Encomendada pelo governo federal ao Fórum Brasileiro de Segurança Pública, a pesquisa também faz um recorte por unidades da Federação e coloca a Paraíba
no topo do ranking. Lá, a chance de o jovem negro morrer violentamente,
assassinado ou em acidentes de trânsito é 13,4 vezes maior do que a do
jovem branco. No Paraná, estado com menor risco, a proporção é inversa,
já que a taxa de homicídios de jovens brancos é um pouco maior que a de
negros: 0,7. Valores mais próximos de 1 indicam maior proximidade entre
os dois segmentos.
Secretário de Juventude, Esporte e Lazer do estado, Carlos Ribério
Santos lembrou que as autoridades públicas locais estão atentas para o
problema e que os dados não são uma “novidade”. Ele informou
à Agência Brasil que desde 2011 algumas ações estão sendo desenvolvidas
no âmbito do esporte, da cultura, educação e saúde, na tentativa de “criar um cenário favorável à diminuição dessa mortalidade”, mas aque “ainda é cedo” para apresentar resultados.
Uma das frentes tem o objetivo de inserir o jovem negro no mercado de
trabalho. Segundo o secretário paraibano, seis escolas técnicas
estaduais serão inauguradas em 2015, oferecendo cerca de 15 mil vagas.
Posteriormente, mais nove escolas serão entregues. “O estado nunca
fez essa incursão pelo ensino técnico profissionalizante [antes]. Sem
qualificação para o trabalho, dificilmente o jovem vai ser integrado”, afirmou. Ele acrescentou que o “contexto de marginalização” não é só estadual e que o tema precisa ser debatido nacionalmente.
Demandante da pesquisa, a Secretaria Nacional da Juventude
tem como principal programa de enfrentamento aos índices o Plano
Juventude Viva, que visa a prevenir a violência contra a juventude negra
em 142 municípios prioritários. Essas cidades concentraram, em 2010,
70% dos homicídios contra os jovens negros. Para Fernanda Papa,
coordenadora do plano, os dados contribuem para analisar por que o jovem
negro é mais exposto e mostrar a necessidade de mais políticas públicas
para esse grupo.
“O índice ajuda a mostrar que o jovem negro do sexo masculino é o
que está mais exposto ao risco de perder a vida. Se o seu direito
humano mais fundamental, que é a vida, pode ser violado, provavelmente
ele já teve outros violados, como a educação e o direito de ir e vir”, observa Fernanda. “Esses direitos fundamentais têm que ser considerados para o jovem negro com urgência”. De acordo com a coordenadora, essa não é uma vontade do jovem negro. Trata-se de “um passivo de séculos”, quando, por exemplo, os negros foram impedidos de frequentar universidades.
Renato Sérgio de Lima, que coordenou o estudo, destacou a importância
de um monitoramento sistemático desses índices e da implantação de
políticas voltadas à prevenção de mortes. Para ele, essa gestão
integrada dos dados vai permitir “mapear de forma precisa os territórios
que exigem investimento específico”, de forma inteligente. “Não é
só passar dinheiro, é costurar grande pacto pela integração desses
sistemas de monitoramento. O que o Brasil aplica não é suficiente, mas
está longe de ser pouco. Precisa melhorar a qualidade de investimento”, defendeu.
Com os recursos, as políticas devem focar na redução da desigualdade racial e dos homicídios de jovens negros. “Não é uma questão de racismo, mas civilizatória”, declarou o pesquisador da Fundação Getulio Vargas. Para mostrar “claramente que a desigualdade racial afeta negativamente a vulnerabilidade juvenil”,
explicou Renato, o estudo traz uma tabela que simula a eliminação
completa da desigualdade racial e revela que o risco se reduz
drasticamente em todos os estados.
Dos 142 municípios prioritários do Plano Juventude Viva,
100 aderiram ao plano e 47 já tiveram as ações lançadas, envolvendo
inclusão social, a oferta de equipamentos e transformação de territórios
onde há altos índices de homicídios. Evitar situações de violência nas
esferas que estão ao alcance do Estado também faz parte das missões do
plano, de acordo com a coordenadora Fernanda Papa. Ela reconhece a
existência de alguns casos em que os agentes de segurança cometem abusos
que acabam tirando vidas inocentes, e afirma que uma das formas de
coibir o grau de letalidade policial é a “inclusão do tema do racismo na formação dos profissionais de segurança pública”.
Renato Sérgio Lima disse que os dados desconstroem a noção de que
somos um país pacífico nesse quesito e revelam que não podemos mais
esconder o problema sob o risco de estarmos boicotando nosso futuro. “Há
um enorme passivo histórico. O Brasil, enquanto nação, foi construído
com base na ideia de um país pacífico e de convivência entre as
diferenças. Se a gente quer uma nação democrática, moderna e
protagonista, vai ter que enfrentar esse problema”. Segundo ele, a população que está morrendo é a que vai fazer falta para que o país seja economicamente robusto daqui a pouco.
O estudo, ainda preliminar, deve ser lançado na próxima semana pela Secretaria-Geral da Presidência da República.
De acordo com Fernanda Papa, o próximo passo será apresentar o índice
aos estados e disponibilizá-lo a pesquisadores e instituições de
segurança pública. Ela disse que espera a continuidade da pesquisa em
busca de um diagnóstico permanente de acompanhamento do risco.
Paulo Victor Chagas, Agência Brasil
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