O Presidente reeleito do Senado, José Sarney (PMDB-AP), ainda não engoliu a derrota de seu grupo político em 2010.
Por Heverson Castro
Da Folha do Estado
A situação de insolvência da Companhia de Eletricidade do Amapá (CEA), que vem se arrastando há, pelo menos, oito anos, acabou virando instrumento de manipulação política no Ministério das Minas e Energia (MME), comandado por Edison Lobão, preposto e amigo pessoal do senador José Sarney (PMDB-AP), presidente do Senado.
Por conta dessa relação de compadrio entre Lobão e Sarney, o MME demonstrou recentemente que pretende se colocar numa posição claramente antípoda ao governo Camilo Capiberibe (PSB) no concernente às negociações sobre o endividamento da CEA, estimado em R$ 1,4 bilhão. Edison Lobão não recebeu o governador amapaense (a assessoria alegou que o ministro estava doente) para evitar qualquer tipo de compromisso. Em seu lugar, mandou o secretário-executivo da Pasta, Márcio Zimmermann, cujo poder de negociação é limitado.
Contudo, Zimmermann estava bem orientado. Durante o encontro com Camilo Capiberibe apresentou a contraproposta do MME: o débito do Amapá deveria ser quitado em 15 dias. Um tempo exíguo sobremodo se comparado aos prazos elásticos que o antecessor obtinha em Brasília, sempre tendo como cicerone e intermediário o próprio presidente do Senado.
A manobra não passou despercebida pelo Palácio do Setentrião. A entourage de Camilo Capiberibe percebeu nas entrelinhas que o senador José Sarney não engoliu a derrota de seu grupo político no Amapá nas eleições de 2010, e que por conta desse malogro pretende dificultar, ao máximo, qualquer negociação do governo pessebista em Brasília, mesmo que a presidente Dilma Rousseff (PT) entenda o governo Camilo como aliado.
O staff de Camilo Capiberibe igualmente vem observando mudanças no cenário político local após o malfadado episódio em Brasília, quando o governador do Amapá levou um tremendo “chá de cadeira” na antessala do MME, para ser recebido, depois de muito tempo, pelo subalterno de Edison Lobão, o ministro de José Sarney. Eles notaram que, sob a orientação do presidente do Senado, começa a ser constituído no Amapá um “bloco” de oposição ao novo governo, coordenado internamente pelo senador Gilvam Borges, também do PMDB.
A estratégia, a princípio, parece bem simples. Borges, inimigo fidagal da família Capiberibe, pretende reunir o maior número possível de insatisfeitos com o atual governo no entorno de si, incluindo aí empresários e políticos, além de representantes da mídia local, para operacionalizar nos bastidores ações contrárias ao principal ocupante do Palácio do Setentrião.
Uma das principais articuladoras dessa “neo oposição” será a deputada estadual Marília Xavier (que substituiu o sobrenome Góes após ser eleita em 2010). Outro “insatisfeito” por ter sido preterido como ungido do governador para ocupar a presidência da Assembleia Legislativa do Estado do Amapá, é o deputado estadual Edinho Duarte (PP), até recentemente eminência parda do ex-governador Pedro Paulo Dias de Carvalho (um dos líderes do PP no Amapá).
A função de Marília, após tomar posse, será a de estruturar nos intestinos da AL uma rede de parlamentares construída pelo “bloco” liderado por Sarney para inviabilizar qualquer projeto – ou medida – enviada pelo governo e, fundamentalmente, dar visibilidade aos “erros” de Camilo Capiberibe enquanto governador. Ou seja, criar massa de manobra e bucha de canhão para contrapor as decisões do governo, mesmo que tenham finalidades sociais.
Já Edinho Duarte ainda não se recuperou do trauma catártico ocasionado pelas derrotas sofridas nas entranhas do governo Camilo Capiberibe. Perdeu todo o poder que tinha no governo, inclusive foi obrigado a engolir em seco as exonerações da mulher, Cleuma Duarte, e do filho, Diego Duarte, além de membros de seu grupo retirados à força de fórceps dos cargos comissionados que ocupavam nas secretarias de Estado. Para os iniciados em política de bastidores, Edinho levou uma surra de alto nível, daquelas que não arrancam sangue nem lágrimas.
Mas, político profissional não guarda mágoas. Sabe que moscas azuis existem aos montes, mas suas picadas, quando extemporâneas, só contaminam os tolos. Por isso, redireciona o discurso, revestindo-o com adjetivos, apresentando-o mistificado, atenuado, construindo-o, somente, para agradar a quem está do outro lado da mesa. Nesse aspecto, Edinho Duarte é imbatível. Pode compor, sim, o “bloco”, porém, numa relação estritamente colonialista. Não será massa de manobra, tampouco bucha de canhão.
O episódio MME, quando Camilo Capiberibe foi tratado como coadjuvante em Brasília, revelou a dimensão do contencioso entre o grupo que chegou ao poder no colo do Ministério da Justiça, leia-se Polícia Federal (deflagração da Operação “Mãos Limpas”, em setembro de 2010), e o grupo de José Sarney, cujo talento em reciclar o esdrúxulo regional em finos biscoitos globalizados é o segredo (agora, não mais) de sua longevidade no cenário político local.
Além de herdar um Estado insolvente, com dívidas estratosféricas, Camilo precisará de muita habilidade para contornar a enorme crise institucional e assim equilibrar-se na maromba que escolheu (tornar-se governador do Amapá) em meio à intensa artilharia. E agora, agravada após a coligação Frente Popular (PT/PSB), e o diretório regional do PSB, ingressarem no Tribunal Regional Eleitoral (TRE) com recurso contra a expedição do diploma de deputada federal concedido à Marcivânia Flexa (PT), e de diploma de senador e suplentes de senador de Gilvam Borges, Geovani Borges e Salomão Alcolumbre.
A ação contra Marcivânia pegou o PT no contrapé. Lideranças petistas retrucaram que o PSB usou indevidamente o nome do PT – ou da coligação – nesta ação. E partiram para o contra-ataque, com trocas de farpas e apresentações de justificativas adequadas às circunstâncias de cada contendor. Marcivânia reagiu com “perplexidade, frustração e tristeza” por que não esperava isso dos aliados, segundo repetiu à exaustão em entrevistas às emissoras de rádio e TV.
Ressaltou que o PSB se utilizou indevidamente da sigla do PT. “Como o único representante da coligação PSB/PT é do PSB, eles utilizaram a coligação, o que faz parecer que o PT está pedindo a cassação de nosso diploma, uma total falta de ética e de respeito pelos aliados”, disparou, acrescentando que “sempre agiu como aliada durante todo o processo movido pelo PMDB contra os Capiberibe” - o PSB briga nos tribunais para garantir os mandatos de senador de João Capiberibe e de deputada federal de Janete Capiberibe, cujos registros de candidatura foram indeferidos com base na lei “Ficha Limpa”.
Atuando como um bombeiro, mas ainda inábil em lidar com o canhão, Camilo Capiberibe entrou no Twitter (microblog de 140 caracteres) para revelar a intenção em propor ao PSB a revisão da ação contra a professora Marcivânia, alvejada em pleno voo por tiros de bacamarte disparados por quem antes afagava-lhe o ombro. Surpreendida pela ferocidade do ataque, a deputada viu-se, por instantes, às portas do inferno perseguida pelo próprio Cérbero.
Camilo contemporizou, salientando a parceria PSB/PT como fundamento da governabilidade que se tornou o princípio basilar de seu início de mandato. Uma mudança cujo figurino surpreende pelo espalhafato: tailleur sobre saia rústica, com salto plataforma ao estilo Beyoncé do Pará, combinando adereços no pescoço, pulsos e tornozelos. No mínimo, confuso pois assimila todos os estilos, todas as cores e todas as tendências.
Periódicos saudosos de tempos não tão distantes, trataram de superdimensionar o entrevero denominando-o de “crise”. Um recurso assaz antigo, antiquado em sua totalidade, mas ainda aplicado em pleno século 21 por quem manipula o jornalismo como instrumento de barganha. Trata-se de parte da estratégia que começa a ser aplicada pelo “bloco” de José Sarney, cujo epicentro é transformar redemoinhos do governo Camilo Capiberibe em furacões devastadores. A técnica empregada na construção das matérias jornalísticas objetiva acentuar os pontos negativos para impactar a população com manchetes transversas.
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